José Carlos Matias
A regulamentação do Artigo 23º da Lei Básica, respeitante à Lei de Defesa da Segurança do Estado, em 2009, foi um grande teste à Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). Em cima da mesa estava a articulação da necessidade de preservar e promover a soberania e segurança nacional e os princípios basilares do sistema jurídico distinto da região, cumprindo e concretizando a lei fundamental da RAEM. O resultado final acabou por ser uma síntese que gerou um amplo apoio local, num processo em que foram tidas em consideração opiniões de juristas locais. Em suma, houve uma boa dose de bom senso e proporcionalidade.
A RAEM tem sido, aliás, constantemente elogiada pelo Governo Central pelo seu empenho na prática correta do princípio Um País Dois Sistemas. Não se conhecem movimentos ou sequer vozes em Macau que coloquem em causa a soberania e integridade territorial da República Popular da China. Pelo contrário; o generalizado sentimento patriótico das gentes locais é uma evidência, mesmo junto do chamado campo pró-democracia. Posto isto, o texto publicado na semana passada no site do Gabinete do Secretário para a Segurança sobre a necessidade de aperfeiçoar o Regime Jurídico-penal relativo à Defesa da Segurança do Estado causa perplexidade. No artigo é referido que, passados nove anos, há uma perceção de que a lei que regulamenta o artigo 23º da Lei Básica “está pronta, mas não se usa, mantendo apenas os seus efeitos dissuasores”.
Posteriormente, o Gabinete do Secretário afirmou à Rádio Macau que não há planos concretos para rever a lei e que, afinal, o texto em causa é resultado de um estudo levado a cabo por iniciativa de um funcionário do gabinete, sendo que a intenção seria “partilhar essa reflexão com os cidadãos de Macau”. Subjazem, no entanto, questões sobre a necessidade, intencionalidade e oportunidade desta publicação, sobretudo face à crescente onda securitária local e aos ventos que sopram do Norte.
É crucial que haja sentido de equilíbrio, nomeadamente numa altura em que a RAEM se prepara para adotar a lei do hino nacional e a lei da cibersegurança. A chave está na harmonização da raison d’etat com os direitos, liberdades e garantias. E no exercício do poder e aplicação da lei é fundamental que, para evitar arbitrariedades e discricionariedades, se observe não apenas o princípio da legalidade, mas também o bom senso e sentido de proporcionalidade. Algo que nos últimos tempos tem faltado.
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