Texto publicado no Hoje Macau em 27-11-2008
José Carlos Matias
A strong China means a strong Pakistan”
Asif Ali Zardari, presidente do Paquistão de visita a Pequim em 15 de Outubro de 2008
A frase de Zardari poderia ser resumida na súmula do jogo de soma positiva (win-win game): O que é bom para a China é bom para o Paquistão e vice-versa. Mudam os governos em Islamabad, mas do ponto de vista estrutural a aliança com a China permanece intacta. A visita de Zardari em Outubro a Pequim trouxe à tona uma tendência de reforço das ligações que remontam a 1950 quando o Paquistão se tornou num dos primeiros países a reconhecer a então recém-criada República Popular da China.
O inimigo comum
Numa análise do estado das relações entre os dois países, em primeiro lugar vale a pena olhar para a evolução das relações sino-paquistanesas. Desde 1963 que as relações entre a China e Paquistão têm sido marcadas por uma “cordialidade invejável”, nas palavras do académico paquistanês Pervaiz Iqbal Cheema. Este clima tem sido uma constante, mesmo depois da reestruturação do sistema internacional, com o fim da Guerra Fria. Os confrontos fronteiriços entre a China e a Índia em 1962 deram um impulso aos laços entre Pequim e Islamabad cuja fundação se prende sobretudo com lógicas de aliança com base na balança de poderes no Sul da Ásia e com a percepção de ameaças – na terminologia de Stephen Walt, os Estados firmam alianças com base na percepção de ameaças externas (“balance of threat theory”). Findo de forma abrupta e violenta o curto período de amizade sino-indiana, a China virou-se para o rival e inimigo de Nova Deli para lançar uma base alargada de cooperação. Em 1965, na sequência da Guerra sino-paquistanesa, os EUA impuseram um embargo à venda de armas, que levou Islamabad a virar-se para Pequim, que não perdeu tempo a aproveitar a oportunidade, firmando vários acordos relativos a cooperação na área da defesa e infra-estruturas portuárias e militares. Mais tarde, noutro contexto – uma vez que Islamabad manteve canal com Washington – o Paquistão acabou por desempenhar um papel importante na aproximação entre a China e os EUA, no início dos anos 1970.
A balança de poderes
A política Chinesa para o Sul da China tem sido focada tradicionalmente na segurança das fronteiras sul e na prevenção de qualquer iniciativa expansionista da Índia. Nesse sentido a lógica da balança de poderes e de ameaça funcionou. Do lado paquistanês a aliança com Pequim é uma mais-valia crucial face a Nova Deli, pelo que o investigador Hunag Jing considera que “o Paquistão precisa mais da China que a China do Paquistão”. Regressando ao jogo de palavras em epígrafe, na citação de Zardari, sendo certo que uma China mais forte implicará um Paquistão fortalecido, o inverso não é necessariamente verdade. Para um poder médio como o Paquistão, nas relações com uma grande potência os critérios que servem de base para uma aliança devem estar centrados por uma lado na correcção de equilíbrios regionais, por outro no processo de desenvolvimento económico. Esta asserção aplica-se que nem uma luva às relações sino-paquistanesas.
De um ponto de vista geopolítico, ao passo que procura construir e fortalecer o seu arco de influência na Ásia, Islamabad não se importa com a emergência chinesa na medida em que os laços com Pequim ajudam Islamabad a reforçar o seu estatuto de poder regional. O Paquistão é, aliás, dos países vizinhos da China em que menos impacto tem a percepção da China enquanto ameaça. Não é por isso de estranhar que durante a passagem da tocha olímpica não tenha havido protestos anti-Pequim.
Laços económico-miliatares
As ligações económicas e ao nível da segurança e defesa têm caminhado lado a lado ao longo das últimas quatro décadas. A China tem dado um apoio significativo no apoio às actividades nucleares paquistanesas. Além disso, tem contribuído também para a modernização do armamento convencional do Paquistão. No longo prazo, o objectivo do Paquistão será alcançar um acordo semelhante ao que Nova Deli firmou com Washington para a comercialização de tecnologia, apesar de não ter assinado o Tratado de Não Proliferação Nuclear.
O apoio económico chinês também é significativo, sendo o Paquistão um destino de topo da ajuda ao desenvolvimento da China. Em Julho deste ano, foi assinado um acordo de livre comércio e um protocolo de investimento que deverá fazer ascender as trocas comerciais entre as duas partes um novo nível. O objectivo é, em 2011 duplicar os 7 mil milhões e dólares registados em 2007. Além disso, foram também assinados acordos para a criação de zonas económicas especiais de investimento chinês no Paquistão.
A visita de Zardari a Pequim em Outubro aconteceu também num contexto de grave crise financeira do Paquistão que precisa urgentemente de ajuda para lidar com sérios problemas de falta de liquidez e de escassez de reservas em dólares.
O espinho do fundamentalismo islâmico
Tendo em conta que o Paquistão considera compatível a situação de ter um forte auxílio económico e militar dos EUA e da China e que de Washington os ventos que sopram indiciam um resfriamento das relações, devido à questão das zonas tribais, é provável que Islamabad procure reforçar ainda mais os lados com Pequim. Do outro lado, considerando a falta de confiança mútua que permanece nas relações entre a China e a Índia, Pequim tenderá a continuar a acarinhar esta amizade nuclear. No entanto não se pense que “tudo são rosas” sem espinhos. Repetidamente, a China tem avisado o Paquistão para combater os grupos radicais islâmicos que lutam pela independência de Xinjiang, cujas bases se encontram nos países das antigas repúblicas soviéticas da Ásia central e também no Paquistão. Neste aspecto são, curiosamente, preocupações semelhantes às de Washington quanto às bases de grupos fundamentalistas islâmicos que usam o Paquistão como plataforma para atacar a presença norte-americana no Afeganistão.
Saturday, November 29, 2008
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