O exercício da cidadania está indelevelmente ligado à noção de espaço público. A ideia remonta, pelo menos, à antiguidade clássica, à noção de “ágora” como espaço inserido na “pólis” onde era exercida a cidadania. Os exemplos que nos vêm á mente são desde logo as estradas, as ruas, os parques ou os jardins.
Numa outra vertente, a escola crítica introduziu o conceito de esfera pública, sede de interacção de um sujeito com o outro, ou a sociedade, algo de importante para a construção da identidade. Habermas fala do “Offenrlichkeit” iluminista, racional, que permitiu a emergência de uma opinião pública e o exercício da cidadania e, consequentemente, de uma certa ideia de democracia. Entretanto, muita coisa mudou, mas o princípio e o conceito continua válido, aplicado às novas realidades.
Por aqui, por vezes. parece que estamos ainda numa era pré-iluminista.
Em Macau vive-se uma situação aparentemente paradoxal. Se, por um lado, as autoridades cerram o punho face à “incivilidade” no espaço público – multas mais pesadas para quem cuspir no chão ou para quem deixar o ar condicionado a pingar para a rua, etc – por outro destroem-se espaços verdes ou decide-se demolir edifícios como a sede da Assembleia Legislativa, num abrir e fechar de olhos, sem vergonha, sem dramas que eles (construtores, operadoras de jogo, de hotéis, etc) precisam de espaço. E o que impressiona (ou talvez não) é a ausência de uma consciência colectiva de preservação do espaço público. Até agora subsistem apenas focos de indignação.
Mas provavelmente para compreender isto convém olhar para trás, como faz Dieter Hassenpflug:
“While the old European city, according to its bourgeois culture, tends to “turn its inside out” by staging public spaces (see the “theatre of facades” of markets and main streets), the old Chinese cities have been introverted (similar to arab cities). Inner courtyard gardens could serve for balancing urban density and hectic pace. However, they provided this only for the small circle of privileged families. Even the use of the city gates, of streets and quarters, were assigned to the different classes in accordance with their rank” (...)
Mas isto não pode ser encarado como uma espécie de path dependence - Percebe-se que algo está a mudar.
E será que os ventos da mudança chegam a este dragão liliputiano à Beira-China plantado? E se chegarem que força terão?
Monday, March 20, 2006
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1 comment:
Olá Zé Carlos,
Tens o meu total apoio quanto a esses problemas que levantaste. Há muito que deixei de pensar nisso, para não ficar com os sentimentos feridos.
A Macau que desde sempre a conheço, a Macau que cresci, em tom crítico tenho de dizer que tal como em qualquer parte do mundo, ou em qualquer governo ou qualquer direcção de qualquer instituto, há sempre pessoas imbecis e mal preparadas para os cargos que assumem.
De uma maneira geral, há certas pessoas, talvez, uma minoria, mas que ocupam certos cargos chave (centros decisores) e essa gente acredito que sejam da pior espécie que existe, incultos no sentido de nem a sua própria cultura perceberem, são quase do tipo analfabetos, que de repente viram-se empurrados para chefiar qq departamento, esses mesmos alinhados dentro daquela lógica de uma das correntes políticas de Macau, dos ortodoxos que são mais papistas que o Papa. Esses mesmos em 2002 ou 2003, tiveram de levar com um berro bem subtil do Governo Central para acabarem com as palhaçadas anti-portuguesas (peso de consciência talvez, por se calhar nunca terem sido patriotas de nada mas sim oportunistas). Já Maquiavel dizia ao Príncipe, para ter cuidado com aqueles que tecem fartos elogios...
Macau, a Praia Grande, a Avenida da República, a Meia Laranja, a Pousada de Santiago da Barra, o cheiro a maresia, o pôr do Sol em frente à pousada, em que o laranjão do sol se esconde por detrás da montanha. Os estrondos que se ouvem da meia laranja de rebentarem pedra na ilha da Montanha ou Lapa (de frente à Barra), os antigos camiões carregados de camarão seco e o cheiro que deixavam pelo ar no jardim da casa da Avó, que ficava na esquina da Rua da República com a Avenida da República, todas estas são as minhas memórias da minha Macau. Não me queixo da boa vida e vivência que tive na minha terra, compreendo que há certos selvagens que não têm amor pela terra, pela mesma terra que lhes deu a tal oportunidade para serem alguém na vida, a isso chama-se em chinês, cuspir na tigela que se come, ou tanto que come da tigela, tanto que a vira do avesso. Pessoas sem carácter. O que há a fazer é rezar para que alguém de bom senso ponha um travão nisso, pois no mundo não existem só pessoas más, mas também as pessoas não são boas de natureza, são o que são e há de tudo.
Mas tal como já Adam Smith dizia, tudo se regulará pelo mercado.
Quando virem que descaracterizaram Macau de tal maneira que se tornou num sitio enfadonho, logo sofrerão baixa nos seus resultados económicos. Talvez muitas pessoas deixarão de querer viver em Macau, talvez muitos construtores entrem em falência e comecem a atirar-se dos prédios ou das três pontes (já há mais escolhas), e assim e só assim é que aprenderão aquilo que nunca aprenderam na escola, que o desenvolvimento económico é centrado na vida humana, e para tal é necessário ter a consciência do desenvolvimento sustentado.
Até lá esses directores e compinchas amigos têm ou de ir à escola, ou aprenderem com os erros. Esta segunda hipótese é mais perigosa, pois o que se estragou, dificilmente se poderá recuperar.
Sem árvores, e sem natureza, estou certo que doenças aumentarão i.e. cancro, devido à poluição, à falta de espaços livres, tal como os chineses da zona, são dados aos diabetes, e ao colesterol, talvez seja necessário uma "linda" praga ou catástrofe para assolar a terra abençoada, ao melhor estilo de sodoma e gomorra, para que os homens aprendam de uma vez por todas a respeitarem a mãe natureza.
Como em tudo na vida, a economia irá regular todos esses requisitos, é uma questão de tempo.
A propósito de doenças e enfermidades, lembrei-me de uma cena caricata, em que um suposto director de um serviço público ou privado, tinha um amigo muito doente no hospital Conde de São Januário. Ao período pós-transição, o sr. director virou-se num anti-português ferranho (como muitos oportunistas se viraram para tentarem ganhar as graças do Governo Central, mas na hora de aflição o próprio director, agachou-se de cócoras, e de quatro, foi pedir ao portuguesito para interceder junto aos médicos CHINESES para tratarem bem o amigo, porque pelos vistos, o pobre do director sentiu dificuldades...e afinal até pareceu-me que tinha dificuldades em comunicar em chinês...Se o portuguesito não fosse amigo não teria estendido-lhe a mão, pois bem aventurados sejam os pobres de espírito.
Macau sã assim.
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